domingo, 20 de novembro de 2011

Artigo/Pra. Nadia Malta/VOCÊ NÃO SE ENXERGA?

VOCÊ NÃO SE ENXERGA?

O início da minha infância, até os quatro anos de idade foi um tempo de reinado absoluto no qual todas as atenções eram voltadas para mim, primeira filha, primeira neta. Era o máximo, tudo convergia para mim! Aí vi meu reinado desmoronar com a chegada do meu irmão, que acabou roubando a minha cena, pois nasceu com um problema de saúde e todas as atenções da casa eram voltadas para ele, ele virou meu estraga prazeres!

A mudança de cenário, no entanto, não impediu que tentasse de todas as formas reconquistar o meu lugar que havia sido violentamente usurpado pelo “estraga prazeres”. No meio daquele reinado desmoronado, uma das perguntas prediletas da minha mãe era: “Você não se enxerga, não?”. Isso porque na minha tentativa de chamar a atenção dela, foi não foi lá estava eu vestindo as suas roupas e calçando seus sapatos de salto, os mais caros. Perdi a conta dos saltos que quebrei ao meio, pois o pé, ainda hoje muito pequeno, não chegava até o salto e se apoiava na metade do sapato quebrando ou entortando-o quase sempre. O que me valia boas e doídas palmadas e beliscões acompanhados é claro, da célebre e insuportável pergunta: “Você não se enxerga, não?”.

É interessante como imagens e palavras da infância, emergem da nossa memória, fazendo-nos aplicá-las ao tempo presente, mesmo tendo passado tantos anos!

Os anos passaram, mas as palavras de minha mãe não passaram e estão a balizar determinadas coisas que tento fazer sem a devida habilitação, elas me fazem recuar sem constrangimento. Hoje sou pastora de uma pequenina parte do rebanho de Deus, por vocação. O caminho percorrido entre o despertar da vocação, o reconhecimento do dom e do chamado, a preparação e o exercício efetivo do ofício, foi um parto à fórceps. Como foi difícil para mim me enxergar como alguém que tem um chamado de Deus para uma obra específica! Aliás, todos os escolhidos têm um chamado, resta saber qual.

Queria sempre à semelhança de Jonas, fugir desse chamado por me achar incapaz.  Mesmo hoje no exercício pleno do ministério, continuo me achando incapaz, mas para meu alívio, descobri que é o Senhor que capacita e a suficiência de que preciso vem apenas dele e não de mim mesma. Quando nos apercebemos disso, a obra do Senhor flui e acontece porque ele se responsabiliza. Qualquer percepção fora dessa verdade rouba a glória de Deus e se transforma em egolatria.

Os cristãos, sobretudo os que de algum modo estão envolvidos ministerialmente, precisam atentar para a célebre pergunta de minha mãe: “Você não se enxerga, não?”. Ciúmes, competição e desejo de aparecer tem servido de pedra de tropeço em muitas igrejas e muitos ministérios verdadeiros têm sido abortados. Será que o que eles estão fazendo na obra de Deus, não tem quebrado e entortado sapatos ministeriais, na tentativa de fazer algo para o qual não foram chamados?

O apóstolo Paulo nos ordena a permanecer na vocação a que fomos chamados. Na minha infância, na tentativa de chamar a atenção, eu era uma caricatura de minha mãe. Aquela não era a minha realidade, mas eu a queria para mim. Por que aquilo acontecia? Porque estava na infância, que é o tempo das meninices próprias da idade. A criança é naturalmente egoísta, ególatra, gosta de aparecer e receber aplauso pelos seus feitos. Quando nos tornamos adultos as coisas de criança devem ficar no passado. Crescemos, precisamos amadurecer!

No Reino de Deus, a obra que fazemos é para exclusiva glória do Senhor. A honra e o aplauso são para ele. O vaso que se exalta será irremediavelmente humilhado sem que haja cura. O instrumento dele que somos nós, deve se enxergar, perceber seu real chamado, tirar os sapatos da vaidade e se recolher a sua insignificância. Só a Deus toda glória!

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